14.02.22
A velhice e a clínica ( e lá voltaremos) têm-me ensinado umas coisitas. Demasiado tarde para as aproveitar como sempre acontece comigo, mas ainda a tempo de as passar. Uma delas é que não existe nada mais duro e difícil do que a generosidade, essa prima radiosa da bondade.
Gasset brinca ( El Espectador, 1925) com o sentido original do termo ( testemunha, tradução literal do martyros grego) quando uma ninfeta o interpela. Ela quer saber como Gasset vive sem apanhar sol:
- Es qué yo no vivo, señora.
- Pues qué hace usted?
- Asisto a la vida de los demás.
É por vezes a sensação que o psicoterapeuta tem: a de assistir à vida dos outros. O objectivo, infantil talvez, reconheço, é extrair os factores comuns - o que existe em todas as relações, em todos os cenários. A tarefa lá vai, aos tortolos, hesitando entre o desperdício e a solidão. Tenho notado um ponto comum nos que menos desperdiçam e menos se sentem sós: a generosidade.
Estarei a ficar velho e piegas? Velho de certeza, piegas não: continuo o mesmo bode egoísta. A descentralização do ego faz de facto muito bem. Como é que conseguem? Talvez porque no fim de contas os generosos recebam uma recompensa ambrosiana: dependem menos dos outros. Desperdiçam menos e suportam melhor a solidão.