09.04.22
Chorar alivia?
Tens um novo advogado, o dr Bucefálo. Nada na sua aparência te faz recordar que ele foi em tempos um general de Alexandre da Macedónia". Adoro o Kafka humorista-depressivo das pequenas histórias ( algumas nem meia página têm) e esta é a abertura de "O novo advogado". Trago-a porque nos pode ajudar a responder à pergunta que titula este texto.
Nem sei quantas pessoas choram à minha frente todas as semanas. Há muitos anos que é assim. O enorme carregador de lenços de papel é mudado todas as semanas. O lado bom: ainda sinto o sofrimento delas ( empatia dizem os burocratas). O lado menos agradável é que estas parlendas fazem-me pensar se não ando há muito tempo a viver a expressão emocional dos outros. Uma espécie de vampiro de muletas. Adiante. Este choro é diferente, claro: a pessoa está num contexto terapêutico e é costume aliviar-se .O outro choro, o solitário, interessa-me mais. Deixo de fora o choro de alegria, não me diz nada a não ser no estádio da Luz.
Aprendi que se choramos de angústia antecipada o choro não alivia, até aumenta a ansiedade, mas se choramos por causa do que já se passou melhoramos um cadinho. O mistério? Por acaso nenhum. A descarga emocional é inevitável e obrigatória e a alma alivia-se como a bexiga. Já o amargo das lágrimas, o que interessa, depende se somos o dr. Bucéfalo ou um general de Alexandre: prefiro o advogado experiente nas aboízes das leis ao general deprimido na enfermaria.