13.08.22
Como aqui informei os meus trinta e quatro leitores, um dos neoestóicos que levei este ano para a tortura das férias foi o Gracián. Só tinha a Arte da Prudência, mas O Homem Universal e Herói acrescentam à marinada e muito bem. Sendo um autor coevo de Espinoza, Quevedo, Pascal etc também bebe nas mesmas influências clássicas, sobretudo em Epicteto. Certo, mas para além da milionésima receita das virtudes do príncipe, os conselhos dos estóicos são sempre bons para suportar a praia.
O natural de Belmonte ( a espanhola) recorda-nos uma crítica: a paixão consiste não em ficarmos emocionados mas em deixarmo-nos ir e seguir esse movimento fortuito. Como vêem, os estóicos não são os sacanas frios e insensíveis que o cinema ou os livrinhos de citações pintam: são piores. Talvez, mas úteis.
Vejamos duas situações práticas envolvendo automóveis:
Uma discussão no trânsito. O outro gajo sai do carro ao berros insultando os nosso progenitores ( ou o Benfica) e avança ameaçador. Se desligarmos do asco e da ira e o virmos apenas como um rotineiro parceiro do ringue, os movimentos ( um directo à seccção hepática por exemplo) saem harmoniosos e naturais. Nada fortuitos.
A segunda também é boa. Uma senhora ( no caso de sermos um pobre hetero), traduzindo as maravilhas da evolução, estaciona ao nosso lado e roga-nos que a ajudemos a resolver uma contractura muscular no glúteo superior esquerdo. Se apenas nos emocionarmos com o nascimento da ideia, guardamo-la e explicamos que temos de ir dar milho às pombas. Haverá mais glúteos na vida e sem estacionamento em paralelo.