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PERDER BEM por Filipe Nunes Vicente

23.02.22

Não temos uma visão clara da actual mobilidade das relações duradouras. Os números  indicam com  tenacidade o aumento progressivo dos divórcios mas isso diz-nos pouco: tenho na consulta  casais  juntos há vinte anos, com filhos,  que nunca passaram no cartório muito menos na igreja. A langue de bois remete-nos para  a crise, a falta de emprego etc. Querem dizer que quando se dá a recuperação económica os números baixam? Está bem abelha.

No meu pequeno canto faço outras contas. As relações longas tendem a cristalizar em categorias anti-amorosas: a cooperação familiar, a economia  comum, a propriedade sexual. Ora, a base da uma relação amorosa é a atracção mútua. Sem ela as relações longas caem num amável logro: temos uma relação porque estamos juntos. As relações amorosas assentam no princípio inverso: estamos juntos e por isso temos uma relação.

Já sei que me  vão falar do desgaste natural do tempo. Sim, o tempo ( e o sal) só  faz o bacalhau e os presuntos e muito bem. Não há nenhum motivo  para que o tempo  mate uma relação. Ele é o culpado sistémico, o Shylock ( ou outro judeu qualquer) da política amorosa. Quantas vezes  não fiz mediação conjugal  em relações  com dois ou três anos?

Quando uma coisa tem de acabar isso não se discute. Do que falo aqui é do antes. O tempo, o tal judeu sistémico,  é a causa sem efeito.

             

 

 

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