11.02.22
Forerindring, a dupla recordação, a invenção do amável Kierkegaard. Já a trabalhei várias vezes nos livros e nos blogues.
Um casal de velhos junto à lareira. Ela lembra-se daquela vez em que quase contou ao marido que o tinha traído sexualmente quando eram novos. Isto difere da memória porque não é uma condição transitória como ele diz? Dá o exemplo da demência. É curioso que quando se instala um défice cognitivo na velhice as memórias antigas são as últimas a cair. Talvez ele tenha razão.
Então o foreindring interessa-nos como técnica para organizar a memória e o tempo. O dinamarquês dá o exemplo de dois homens que recusam rever, por razões diferentes, um determinado lugar. Um deles pode ser motivado por querer re-recordar: manter a memória que organizou desse lugar. Tive essa experiência quando trabalhei na casa onde nasci e vivi até ser adulto. Salas, quartos, paredes, sons, cheiros: um mundo inteiro reapareceu, mas ainda consigo re-recordar essse mundo à luz da minha infância e não como espaço de trabalho.
Parece então que por vezes queremos recordar a recordação. O foreindring faz de nós argonautas criativos a traçar um percurso que já fizemos.