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PERDER BEM por Filipe Nunes Vicente

05.02.22

Os telefones convencionais  não alteraram uma cultura da escrita. Em 1982, Walter Ong, um padre e professor de Yale abespinhado  com as relaçoes entre a oralidade e a alfabetização, escrevia que  a escrita dava  ao  grafolect ( uma escrita estandardizada como o inglês) um poder  muito maior do que qualquer dialecto puramente oral. Pois, mas também vaticinava que a palavra falada resistiria, porque toda  a escrita tinha de se submeter  ao mundo do som. 

Os telemóveis são interessantes no fim das relações amorosas. Não por aquilo para o qual foram pensados - falar - mas pela escrita.  Quantas vezes  uma mulher me diz indignada : Ele acabou comigo por SMS.  A bem dizer, a tecnologia não mudou nada de essencial  no mundo das rupturas amorosas. Essa mensagem é uma fala.

A queixa da mulher seria  a mesma se ele tivesse chegado à mesa do café e tivesse vocalizado está tudo acabado. Talvez sim, talvez não, mas a forma mudou.  Aqui lembro-me de Walter Ong e dos seus lamentos sobre o fim da retórica. O homem teria mais dificuldade em ser tão sucinto. Pelo menos teria de ouvir a mulher. Seria uma coisa a dois.

Então o que mudou? Talvez o que muda sempre com a tecnologia: a velocidade do processo. Isto levanta o problema de saber o impacto dessa velocidade na comunicação e, no caso analisado, na desordem amorosa. A velocidade implica a solidão do actor. Fica o único  responsável pela espessura da interacção. Quando só se namorava por carta ninguém desligava o inexistente telefone  na cara de ninguém nem era comum acabar por telegrama.

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