05.02.22
Os telefones convencionais não alteraram uma cultura da escrita. Em 1982, Walter Ong, um padre e professor de Yale abespinhado com as relaçoes entre a oralidade e a alfabetização, escrevia que a escrita dava ao grafolect ( uma escrita estandardizada como o inglês) um poder muito maior do que qualquer dialecto puramente oral. Pois, mas também vaticinava que a palavra falada resistiria, porque toda a escrita tinha de se submeter ao mundo do som.
Os telemóveis são interessantes no fim das relações amorosas. Não por aquilo para o qual foram pensados - falar - mas pela escrita. Quantas vezes uma mulher me diz indignada : Ele acabou comigo por SMS. A bem dizer, a tecnologia não mudou nada de essencial no mundo das rupturas amorosas. Essa mensagem é uma fala.
A queixa da mulher seria a mesma se ele tivesse chegado à mesa do café e tivesse vocalizado está tudo acabado. Talvez sim, talvez não, mas a forma mudou. Aqui lembro-me de Walter Ong e dos seus lamentos sobre o fim da retórica. O homem teria mais dificuldade em ser tão sucinto. Pelo menos teria de ouvir a mulher. Seria uma coisa a dois.
Então o que mudou? Talvez o que muda sempre com a tecnologia: a velocidade do processo. Isto levanta o problema de saber o impacto dessa velocidade na comunicação e, no caso analisado, na desordem amorosa. A velocidade implica a solidão do actor. Fica o único responsável pela espessura da interacção. Quando só se namorava por carta ninguém desligava o inexistente telefone na cara de ninguém nem era comum acabar por telegrama.