03.04.22
Um dispositivo mental para atenuar a angústia depressiva: planear. Isto obriga o sujeito a um duplo movimento porque não só o faz contar com o mundo exterior às suas tristezas como o força a projectar-se no tempo. São dois cartuchos de calibre grosso.
O sentir depressivo é ensimesmado. Alimenta-se do escrutíno sistemático do que corre mal, das nossas fraquezas e azares. Por instinto fechamo-nos, engolimo-nos, defendemo-nos do exterior. Planear uma acção obriga-nos a olhar para fora.
Por outro lado o projectar-se no tempo ataca a porta principal da depressão: as expectativas negativas. A bem dizer todas as expectativas são negativas, mas não nos vos quero convencer da linha estóica: já desisti há muito tempo. Fiquemos então com meia receita. Se planeamos fazer alguma coisa - ajudar alguém, um pequeno prazer etc - isso força-nos a rever o pessimismo temporal. Dir-me-ão: se é tão simples por que é tão complicado?
O problema reside na natureza dos planos. Frequentemente elaboramos ou dizem-nos para elaborar planos quinquenais e pesados que nos parecem inatingíveis. O negócio é compartimentar o dia e traçar pequenas subida de colina, abrir picadas modestas. Quando tens um acidente e partes as pernas e vais fazer fisioterapia não começas a correr no primeiro dia pois não?